domingo, outubro 31, 2010

Ornette, Vandermark, Brötzmann no Brasil... mas e daí?

Antes de alguém pensar que sou um pessimista, já adianto que devemos abandonar nossos anseios e observar a nossa realidade. Sim, eu particularmente me alegro com a visita destes músicos mais ousados por este país, mas daí a vislumbrar São Paulo como mais uma conexão do restrito cenário do free jazz e improvisação livre, é um tanto quanto prematuro e incerto.
Por quê? O que temos por aqui? Onde estão os artístas brasileiros? Tudo bem, existe o trabalho pioneiro do meu amigo Panda e seu projeto Abaetetuba, mas seus outros integrantes estão trabalhando no circuito europeu. Ah, mas tem o Ibrasotope (que está mais ligado a outro cenário musical), o Otis trio... Mas estes por acaso estão se integrando, formando a base de um cenário ou cada um está fazendo o seu próprio caminho? Eu mesmo confesso que não tenho me empenhado em meu próprio projeto ou voltado a trabalhar em algo futuro com o Panda.
Veja o caso do meu caro Ivo Perelman, que parece preferir trabalhar de forma independente, como atração estrangeira, não tendo muito sucesso em se relacionar com os músicos brasileiros. Há algumas especulações em relação a isso, e uma delas não é muito agradável e é polêmica e
não é oportuno abordar agora. Então, mesmo que o Ivo seja brasileiro, já se tornou um estrangeiro em sua terra à muito tempo. O que temos?
Eu mesmo testemunhei uma situação tenebrosa que ocorreu mais de uma vez com meu amigo Panda, que posssui relações sólidas com grandes artístas da improvisação livre, como Veryan Weston, Hans Koch entre outros e ele é sumariamente boicotado nos eventos destes artístas quando se apresentam por aqui, promovidos por certas instituições culturais. Mas pela amizade e afinidade musical, o Panda consegue organizar alguma sessão de improvisação livre com eles, mas longe dos holofotes do enfadonho, mesquinho, provinciano e restrito circuito cultural paulistano. Não? Eu presenciei uma das melhores sessões com o Panda, Thomas Rohrer, Veryan Weston e Trevor Watts num local hostil, uma tabacaria na região dos Jardins. Dava para contar nos dedos de uma mão o número da platéia, não contando com os habitués do recinto que foram pegos de surpresa e que estavam lá por conta da atração oficial da casa.
As duas vezes que o Veryan Weston esteve em São Paulo, o Panda, seu parceiro musical, foi sumariamente excluído da programação dita oficial.
Alegaram que o Panda não era um nome conhecido naquele circuito, que transita no chamado meio independente paulistano. Quem entende e percebe realmente quando uma sessão de improvisação livre é bem sucedida, testemunhou o fiasco daquela fatídica noite no CCSP em que Veryan Weston, Mark Sanders, Luc Ex, Ivo Perelman e outros músicos se reuniram no mesmo palco. Minto? O Panda me relatou o que Veryan, Mark e Luc acharam daquela situação a qual não exporei para não ofender à ninguém.
Na Europa e particularmente em Chicago, nos EUA, o cenário de free jazz e free improvisation existe, mesmo que de forma restrita, por conta de uma comunhão dos músicos, que procuram agregar-se sempre. Todo mundo toca com todo mundo, possibilitando novas experiências musicais para músicos e público.
Será mesmo que estamos caminhado para o certo?

sexta-feira, outubro 29, 2010

Interrompemos a nossa programação para o horário de propaganda política obrigatória

Propaganda: s.f. - 1. Conjunto de atos que têm por fim propagar uma ideia, opinião ou doutrina; 2. Associação que tem por fim a propagação de uma ideia ou doutrina. Ação ou efeito de propagar ou difundir, princípios, teorias etc. Vulgarização.

Até que enfim se encerra este período eleitoral ao qual, particularmente já estava aborrecido, não em relação à política, mas aos caminhos tenebrosos que ela sempre percorre.
Foi com muito pesar que cheguei a conclusão de que não tinha uma opção satisfatória em termos de candidatura. Já basta o tipo de afirmação do tipo: "escolher o menos pior" ou coisa parecida. Não, definitivamente não sou um alienado sobre política, apenas não sou um cientísta político, mas conheço os quesitos primordiais para se viver em sociedade, aliás, política deriva do termo grego polis (πολις), que significa cidade, entendida como a comunidade organizada, formada pelos cidadãos (no grego "politikos"), isto é, pelos homens nascidos no solo da cidade, livres e iguais. Ou seja, se vivo numa cidade, sou político.
Mais uma vez, como se era de esperar, as propagandas eleitorais se assemelham com as dos bancos privados, com uma narração em off ao pé de ouvido, em tom paternal, apelando explícitamente para o emocional, com imagens populistas, de um país em pleno progresso com oportunidade para todos. Os candidatos apelando para o nome de Deus sei lá porquê, pois a maioria nem compreende o que é Deus, quem é Deus ou sequer acredita que ele realmente exista. "Se Deus quiser", "Graças à Deus" se tornaram apenas expressões populares que até os ateístas e agnósticos pronunciam involuntariamente num país idólatra, cheio de crendices, superstições e pré-conceitos em relação à Deus. Quem realmente leu a Bíblia e realmente compreendeu o que alí está escrito? A maioria das pessoas criou a ilusão de que já leu por conta de versículos propagados de forma isolada, sem entender o contexto em que se encontra. Ou muitos tem na memória, os filmes bíblicos que costumam ser veiculados na tv nos feriados religiosos e de fim de ano, que ajudam a criar esta ilusão.
O que me decepciona, são os líderes de denominações cristãs se envolverem neste comércio político. Eles tem o direito de manisfestar sua postura política como cidadãos, mas eu já acho um tanto danoso usarem suas influências perante os membros das denominações as quais são líderes.

"Respondeu Jesus: O meu reino não é deste mundo; se o meu reino fosse deste mundo, pelejariam os meus servos, para que eu não fosse entregue aos judeus; mas agora o meu reino não é daqui." - João 18:36

Não sou contra estes líderes orientarem os membros das igrejas nas condutas sociais, afinal, todos nós estamos vivos e vivendo nesta terra e não podemos espiritualizar tudo em nossas vidas, pois existe a questão prática, do cotidiano, da cidadania. Mas o propósito das igrejas cristãs não deveria invadir outros territórios, pois como disse Jesus Cristo, o reino dele não é deste mundo, não é desta vida. Se uma igreja se diz ser do Reino de Deus ou evangélica, não deve adulterar a Água. Essa é apenas minha opinião particular e cada um tem o direito de pensar o que bem entender, inclusive ir à igreja para conseguir um carro ou uma casa como "benção".

"O meu povo foi destruído, porque lhe faltou o conhecimento;" - Oséias 4:6
"E Jesus, respondendo, disse-lhes: Porventura não errais vós em razão de não saberdes as Escrituras nem o poder de Deus?" - Marcos 12:24
"...pois o povo que não tem entendimento será transtornado." - Oséias 4:14

sábado, outubro 09, 2010

Henry Threadgill: Complete Novus/Columbia Recordings - Mosaic Records Limited Edition Box Set

É um alívio ver um artísta ser reconhecido antes que seja tarde, como costuma acontecer.
Henry Threadgill é um saxofonista e flautista, compositor, bandleader, arranjador, membro co-fundador da AACM, junto com Muhal Richard Abrams, fez parte de um dos melhores trios de jazz contemporâneo, o Air, ao lado do baixista Fred Hopkins e o baterista Steve McCall, colaborador dos projetos de Bill Laswell, sendo que o Material é um deles e inúmeros outros projetos. Henry Threadgill continua em plena atividade, produção e criatividade e me faltariam adjetivos para descrever mais sobre seu trabalho.
Como não sou jornalista musical profissional, não disponho de tempo suficiente para escrever o que é justo sobre Threadgill, apenas uma fração de informações que consegui em minhas pesquisas pessoais. Nos links abaixo, há um pouco mais de informações sobre Henry Threadgill, a AACM e este box de cd's.

http://www.mosaicrecords.com/henry-threadgill

http://aacmchicago.org/henry-threadgill

segunda-feira, outubro 04, 2010

Improvisação Livre, improvisação, improvisadores e "improvisadores"

Ultimamente o Brasil (mais em São Paulo), tem desenvolvido um pequeno circuito de música mais ousada, conhecida como Free Improvisation, às vezes ligadas ao Free Jazz. Ainda é um espaço microscópico, mesmo dentro do circuito cultural metropolitano, mas já desenvolveu um intercâmbio com grandes músicos do cenário mundial como: Phil Minton, Veryan Weston, Mark Sanders, Trevor Watts, Hans Koch e já passaram por aqui, Peter Brötzmann, Han Bennink e Michael Moore (numa situação bizarra com a Mantiqueira?!), Art Ensemble Of Chicago, etc. Alguns grupos e músicos individuais iniciaram seus trabalhos com muita dificuldade no início da década de 2000 e continuam lutando para manter viva esta música.
O grupo Abaetetuba foi o pioneiro na improvisação livre coletiva e músicos como Marcio Mattos (radicado na Inglaterra) e o suiço Thomas Rohrer participaram deste projeto, que surgiu dos encontros de Antonio Panda Gianfratti e Yedo Gibson. A maioria de seus membros está "exilada" na Europa: Rodrigo Montoya faz parte da London Improvisers Orchestra e outros projetos, Yedo Gibson e Renato Ferreira na Holanda com a Royal Improvisers Orchestra e outros projetos e já
possuem o reconhecimento de seus talentos e arduo trabalho e dedicação à música no seu estado mais puro como arte.
Também tem surgido uma nova geração de músicos interessados em Free Jazz e Free Improvisation, assim como um pequeno e até significativo público interessado nesta metrópole totalmente desordenada e cheia de paradoxos. Poucos são os meios de divulgação e informação em termos de mídia produzidos em São Paulo e se não fosse o ilimitado acesso da world wide web, que possibilita todo o tipo de informação e intercâmbio com o cenário mundial destes estilos musicais, estariamos em uma situação miserável em termos de cultura.
Infelizmente os meios mais acessados de informação, inclusive digital, pecam no conhecimento mais abrangente em relação a música livre e ainda vemos pessoas emitindo informações cheias de equívocos e opiniões pessoais que não deveriam ultrapassar as conversas informais com amigos.
Até o circuito de música independente, que teve seu apogeu nos anos 90 com o fenômeno artificial e sintético do Grunge, é até hoje amorfo, prostituido de seus ideais (se é que ainda existe algum ideal no sentido mais poético). Então por essa precariedade do circuito underground, o Free Jazz e a Free Improvisation acabam circulando pelos mesmos espaços, não que isto seja negativo.
O problema reside num problema que remete à raiz educacional e cultural deste país. O improviso ganha um sinônimo de despreparo e estes estilos musicais são justamente o contrário disso. O verdadeiro improvisador, tanto da Free Improvisation e o Free Jazz precisa ter à mão, um vocabulário desenvolvido e um domínio razoável de suas ferramentas, e isso não quer dizer de maneira nenhuma que o músico tenha que ser um prodígio de seu instrumento.
Então encontramos alguns músicos que tem acesso sobre o assunto, mas na prática, estão longe de se enquadrarem no perfil do verdadeiro improvisador. Muitos deles conhecem nomes, gravações de artístas fundamentais, mas isso não habilita tais como improvisadores. Como a maioria do público é formada de leigos, mas abertos à uma sonoridade mais inusitada, ainda não desenvolveram a percepção o suficiente para detectarem se uma peça improvisada foi bem sucedida ou não. Um grande emaranhado de noise e clusters, performances meramente estéticas podem impressionar o novato público. Mas a peça de improvisação possui início, desenvolvimento e conclusão de uma idéia criada naquele instante, contando com o repertório pessoal de cada envolvido. É obviamente equivalente a uma conversa entre pessoas sobre determinado assunto, cada participante necessita estar ao par do assunto, conhecê-lo, para desenvolver o debate, expor suas impressões e a conversa se concluir. Caso contrário, é similar a um bate-papo de ébrios na mesa de um bar, só como pretexto entre as doses ingeridas e o estado de consciência não exige um contexto que se conclua e faça um sentido lógico.
Aos que estão interessados em desfrutar deste estilo musical no seu estado mais puro e livre em termos de arte, tanto como ouvinte ou músico, aproveite o fácil acesso à informação na midia digital, reflita nas reportagens e entrevistas dos musicos que já possuem um histórico neste campo, ouçam e comparem as performances e logo identificarão as características distintas entre este aparente emaranhado de notas e sons. É como um verdadeiro enólogo ou sommelier (sem pré-conceitos de gênero, é apenas uma comparação), que sabe distinguir as suaves diferenças entre as safras de uvas, sabor, qualidade de um vinho. Só que na música, não é recomendada a moderação na quantidade de doses, pois quanto mais, melhor se apura, ao contrário do vinho que quanto mais doses, diminui a percepção. Aprecie com moderação.
 
 
Studio Ghibli Brasil