quarta-feira, fevereiro 15, 2012

Jodie Christian (02/02/1932 – 13/02/2012)

Quando se fala na música mais ousada feita em Chicago, é impossível não falar da AACM, o coletivo de músicos criado em 1965 para o desenvolvimento da música de foma livre e criativa. O grupo Art Ensemble Of Chicago e Anthony Braxton são os nomes mais lembrados, mas a AACM é muito mais que isso. O pianista e compositor Muhal Richard Abrams é um dos pilares fundamentais do coletivo e co-fundador, assim como o pianista Jodie Chistian, que faleceu nesta última segunda-feira. Jodie nasceu em Chicago e aos 16 anos já era um pianista profissional. Após ter se apresentado no grupo de Coleman Hawkins em uma turnê e depois com Ira Sullivan, se associaou à Muhal Richard Abrams, Phil Cohran e Steve McCall para formar a AACM. Mesmo Jodie se considerando em suas próprias definições como um "bebop player", avançou para o experimetalismo e a música livre. Isto pode ser constatado no registro The Flow Of Things do Roscoe Mitchell Quartet gravado numa série de concertos em Chicago. Nos anos 70, direcionou-se no ensino musical, lecionando na Lyon & Healy music store's school e programas de ensino do jazz nas escolas públicas de Chicago. Ao longo de sua carreira, Jodie Christian tocou com Eddie Harris, Lester Young, Benny Carter, Johnny Griffin, Gene Ammons, Dexter Gordon, Yusef Lateef, James Moody, Sonny Stitt, Don Byas, Freddie Hubbard, Milt Jackson, Dewey Redman, Von Freeman, Stan Getz e Sonny Rollins.

sábado, fevereiro 11, 2012

Sorry John Zorn, i can't see you soon...

People say: Ho! Bring the noise! Estou ouvindo um ruído sobre a vinda de John Zorn ao Brasil. Me lembro quando ele veio pela primeira vez no final dos anos 80 e só ouvia falar de um saxofonista de jazz que tocava com a camiseta do Napalm Death. Aquilo me agradou muito, pois a imagem do jazz por aqui naquela época era de um bando de coroas esnobes bebendo whisky e se sentindo no topo do mundo. Naquela época eu era um adolescente que já estava contaminado pelo underground e vibrei com a "afronta" do desconhecido Zorn (para mim), diante dos coroas do jazz. Mas para um moleque era inviável ir à um festival caro patrocinado por uma marca de insalubridade.
Passaram os anos e hoje compreendo a obra musical de John Zorn e ela é relativamente acessível no mundo virtual. Sim, seria um prazer presenciar Zorn em uma apresentação ao vivo. Mas como em boa parte dos casos, existe um considerável porém.
Primeiro lugar, o preço: R$100,00. Muita gente vai me argumentar que no caso é o Zorn, que é uma oportunidade a qual seja possível não ter novamente e blá, blá, blá... Não vem ao caso questionar a qualidade de sua arte, pois é ridiculamente óbvia. O porém reside na confecção desta "grande oportunidade", ou melhor, de oportunismo. O lance nem é de grana, pois Zorn não esbanja simpatia no mercado fonográfico no mundo inteiro. Sim, mesmo no Japão, onde é comum e sólido o circuito de música não convencional, meu amigo sempre consegue comprar discos de Zorn e seu selo Tzadik numa espécie de baciada, a preço de banana. As condições da vinda de Zorn me soam muito mal mesmo, envolve um exclusivismo abominável na noite dita underground paulistana. Alguém vai me dizer que se lasque o local, as pessoas que estão agenciando e o que importa é que Zorn está vindo! Pois é, acho que deixei-me influenciar demais por certas ideologias quando estava mais ativo nos segmentos underground, como heavy metal e hardcore, que impossibilitam-me de abstrair-me de certos poréns e usufruir de certos prazeres. Ainda mais vivendo em um mundo cercado de capitalismo por todos os lados, muitas ideologias, como a do punk, acabam se tornando um tiro no pé.
Mas fazer o que? Na minha escolha pessoal, eu não vou abrir uma exceção. Numa ilustração mais dramática, eu não vou meter os canos pra pipar uma pedra. É isso mesmo, soa radical demais, não? Eu abro mão. Os straight-edgers preferem não beber, assim como a maioria dos evangélicos, que além disso, abrem mão do desejo por um breve momento e só desfrutam dos prazeres do sexo com uma única pessoa que escolheram para amar até o fim. A vida nos oferece sempre escolhas e muitas vezes elas são cruciais e não há meio termo.
Posso viver sem isso e continuar a ser feliz? Sim! Sem dúvida nenhuma! E outra, creio que possa surgir uma outra oportunidade de ver um show do John Zorn sem ter que compactuar com algo que vai contra minha ideologia, da mesma forma que acabei tocando com Han Bennink e Sabu Toyozumi sem vislumbrar uma possibilidade de isto acontecer e ainda sem ter que deixar de lado minhas convicções sócio-políticas e morais.
Olha só, uma coisa eu concordo com que uma pessoa disse sobre punk e hardcore (mas isso independe de estilo ), que se alguém um dia curtiu punk e hardcore e hoje em dia não curte mais, é porque nunca foi.

domingo, fevereiro 05, 2012

Eric Dolphy – The Berlin Concerts (1961)

Particularmente evito ao máximo escrever e falar a respeito de músicos como John Coltrane, Archie Shepp, Pharoah Sanders e Eric Dolphy pelo simples fato de crer que é desnecessário. Ora, estes saxofonistas para quem já fez um mínimo de esforço em pesquisar sobre a segunda mudança radical no gênero denominado jazz ao longo da segunda metade do século XX, se deparou com estes nomes, gravações, algum material audio-visual, impresso, biografias, textos, artigos, etc.
Neste segundo sábado de Fevereiro de 2012, estava conversando brevemente online com meu irmão de fé que é autor do weblog Farofa Moderna e ele estava numa audição de gravações de Dolphy e lembrei que já fazia quase um ano que não escutava um disco inteiro de Eric Dolphy.
Meu primeiro contato com a música de Dolphy foi forte, se deu através de um documentário sobre John Coltrane, que foi ao ar a mais de dez anos no canal de tv estatal de São Paulo, onde haviam takes de uma apresentação do conhecido quarteto de Trane composto por McCoy Tyner, Elvin Jones e a fase de transição entre o contra-baixista Reggie Workman e Jimmy Garrison, tendo a participação de Dolphy. O programa ao vivo foi gravado na Europa e não tenho dados precisos da data e local, mas creio que Dolphy participou do grupo de Coltrane que estava em tournée e ele fixara residência no velho continente como fizera sua geração anterior, para obter melhores condições de desenvolver sua arte. Foi intenso ver e ouvir Dolphy no saxofone alto com sua sonoridade única, que parecia uma mistura de certa parte da fase cubista de Picasso com expressionismo alemão, como os cenários dos filmes de Friedrich Wilhelm Murnau, mas é claro que só ponderei nestas analogias muito tempo depois de digerir a música de Dolphy. Também escutei várias fábulas e lorotas sobre Eric Dolphy, pois em terra brasilis naquela época, ainda era difícil o acesso à internet e publicações sérias e fundamentadas que tinham origem estrangeira. Mas Eric Dolphy ganhou importância efetiva para mim quando estava me aprimorando na bateria e pesquisava e apreciava muito a minha maior influência no instrumento percussivo: Max Roach. Quando comprei o disco Percussion Bitter Sweet de 1961, foi e é até hoje o maior impacto no jazz para mim. E lá estava Dolphy incendiando as ousadas composições de Roach em compassos ternários com um instrumento de sopro o qual desconhecia a existência, o clarinete-baixo. Aquele som grave e incomum que se transformava em tons elevados que Dolphy fazia soar como um violino me despertaram o desejo de tocar o clarinete-baixo e estou me desenvolvendo com ele até hoje. E o principal motivo de não ouvir tanto as gravações de Dolphy foi não me influenciar por ele no clarinete, pois Dolphy consolidou o que posso dizer, o clarinete-baixo como instrumento solo no jazz. Claro que já haviam músicos que faziam uso do clarinete-baixo, como Harry Carney e Buddy DeFranco, mas nunca da maneira que Dolphy o fez. Depois vieram outros que levaram o instrumento em outros níveis de evolução como Anthony Braxton, John Surman e Willen Breuker. A minha estratégia deu certo para não absorver clichês e soar um rascunho mau traçado de Dolphy (graças à Deus!).
Bem, depois da conversa com meu amigo, bateu a saudade de ouvir Dolphy e resolvi compartilhar este momento com esta gravação, que não é tão comentada como Out To Lunch, mas lá estão os clássicos Hi-Fly, composição de Randy Weston onde Dolphy mostra a influência dos pássaros ao tocar flauta transversal e God Bless The Child, conhecida pela voz de Lady Day, que se tornou marca registrada de Dolphy num solo de clarinete-baixo, assim como For Alto de Braxton. O trompetista Benny Bailey pode não ser lá muito lembrado entre os nomes do trompete, mas teve uma carreira sólida desde 1959 e boa parte dela foi na Europa. Pepsi Auer é um pianista alemão e há pouca informação sobre suas atividades, mas é possível perceber a influência de Bud Powell e Horace Silver em sua musicalidade. George Joyner mudou seu nome para Jamil Nasser, tocou com B.B. King, gravou em 1956 no disco de Phineas Newborn, tocou Sonny Rollins, Randy Weston, Al Haig, Ahmad Jamal, Lou Donaldson, Red Garland, entre outros.
Earl "Buster" Smith foi baterista na Arkestra de Sun Ra por um longo período entre as décadas de 80 e 90. Clique na imagem para acessar o arquivo e relembrar como eu ou se ainda não ouviu o suficiente para entender porque Eric Dolphy é ERIC DOLPHY.

sexta-feira, fevereiro 03, 2012

documentários "bruxa de blair" na música

Não fazem muitos anos atrás que um gênero de filme de suspense e terror se tornou em evidência no mercado ocidental: filmes estilo documentário fake (falso, fictício). A estratégia de marketing anuncia que tal produção é baseada em fatos reais e o filme A Bruxa De Blair ganhou notoriedade, com seu estilo documentário, com uma estética câmera manual, sim, daquelas que qualquer um possui para filmar churrascadas, aniversários de casamentos de forma amadora, assim criando uma atmosfera incômoda de fotografia e enquadramento, foco e até chegando ao ponto de muitos questionarem se aquelas filmagens eram verídicas (?!). E assim abriu-se um leque lucrativo para este segmento, com filmes de atividades paranormais, que já eram comuns no mercado do cinema asiático. Baseado em fatos reais... bem, eu em particular não sou cético em relação a existência da atmosfera espiritual, do mundo espiritual, mas não com esta estética creepshow que a maioria associa, e sim, algo muito mais amplo e muito menos fantasioso. Mas esta questão não vem ao caso e agora vou explicar o motivo desta analogia com os documentários e filmes dentro da esfera musical.
Mais uma vez o avanço tecnológico e mercadológico contribuíram na viabilidade de fazer arte cinematográfica sem a limitação e necessidade de orçamentos milionários. Ora, essa democratização finalmente chegou à chamada sétima arte, claro que um pouco mais custosa do que foi para a música, que puxou um belo rodo na tenebrosa indústria fonográfica mundial. Como sempre ao longo da história humana, a liberdade gera benefícios e malefícios em proporções oscilantes.
Ultimamente os segmentos chamados independentes ou underground, tem a chance de registrar em documento visual, as suas recentes trajetórias, com a possibilidade de realizá-lo com muitos de seus personagens ainda em atividade e não tendo que recorrer tanto às montagens de cartazes, fotos, registros em áudio e clima póstumo. Muitos documentários de músicos do chamado jazz são precários, pois na época só gigantescas empresas possuíam equipamentos de filmagem.
Boa parte destes documentários sobre artístas e "cenário" musical, feitos atualmente, principalmente aqui no Brasil, são um tanto fantasiosos, a la bruxa de blair, fake. Como ainda não se formou uma base sólida na confecção de documentários (não importa o formato de midia), ou uma escola, as distorções de realidade ainda predominam. E essa distorção não vem de hoje, pois isso vem desde o primeiro documentário da Terra Brasilis, feito por Pero Vas de Caminha. Só os grandes estúdios cinematográficos comerciais possuíam equipamento audio visual adequado, além de não haver o menor interesse em se fazer um documentário sobre Albert Ayler por exemplo. Mas que raios isso tudo tem haver com a bruxa de blair? A bucha é
o seguinte:
Os documentários estão a mercê da memória do produtor e dos envolvidos, que na maioria dos casos, romantiza e idealiza como os fatos realmente aconteceram, deixando de lado a análise empirica e se entregando às emoções, idealizações, distorcendo a realidade. Isso acontece porque na maioria dos casos, seja sobre a trajetória e uma banda ou nascimento de uma "cena" ou movimento musical, ninguém tinha a visão de começar a colher dados e registrá-los desde o início, como fazem os pais, que guardam a pulseirinha de identificação da maternidade, o primeiro dente de leite que vai, etc. Então o que se registra, é uma imagem onírica do que realmente foi, como se tudo fosse muito bonito, emocionante e tal. Claro que existem depoimentos controversos em alguns casos, mas mesmos estes ganham uma roupagem que travestem em mal ou tristeza poética(???!!!). Claro que muitos que participam destes documentários realmente acreditam que foi da maneira como lembram e as emoções acabam contaminando a legitimidade como documentário, pois a maioria dos que estão envolvidos no projeto, tem uma forte ligação emocional (não que não deva existir), que sobrepõe e distorce os fatos, comprometendo o objetivo jornalístico, se realmente há esta intenção.
O resultado é a geração posterior comprando a idéia de que tivemos momentos maravilhosos nos movimentos musicais de uma forma perfeita, como uma propaganda de margarina, mesmo com os seus conflitos e a geração que vivenciou fica dividida em pessoas tristes por ver o delírio de outros que tem ou não consciência da realidade e sustentam isso.
Mas quem se importa, não é? Muita gente ainda crê que a proclamação da independência do Brasil foi igualzinho a pintura de Pedro Américo e a imigração foi como a novela Terra Nostra...
 
 
Studio Ghibli Brasil