segunda-feira, abril 21, 2014

Eu só queria comer um hamburger...

De um ponto de vista, música e comida tem um mesmo parâmetro, o gosto. Alguém precisa de um crítico pra te convencer a consumir? O que muitos detestam, outros acham uma maravilha. Uma questão de gosto? Sim, mas também há muitos casos de se adaptar o paladar, tanto alimentar como de audição. Como um simples café. Culturalmente foi acostumado a se tomar com açúcar e muitos acham o café sem açúcar uma coisa horrível, como se estivesse tomando dipirona sódica, mas quando o paladar se adapta, o amargor diminui e se acentua o sabor do café. Mas também pode simplesmente ser uma questão de gosto mesmo, mas a maioria não aceita experimentar algo novo, e isso me lembra uma entrevista com Ken Vandermark que fiz anos atrás:

8. Você concorda com John Zorn quando ele declara que free jazz, improv e outras vanguardas musicais em geral não vão alcançar o grande público, mas que seu público se renova a cada geração mantendo mais ou menos o mesmo número de pessoas envolvidas?
Eu penso que os assuntos enfrentados pelos músicos de jazz e improvisação são múltiplos. Primeiro, eu acredito que a mídia mainstream especializada em jazz colocou a forma artística em um gueto musical elitista, ajudando a removê-la da percepção ou interesse da população em geral. Em segundo lugar, a maior parte dessa música é desafiadora para os músicos e, portanto, pro público. A maioria da população não é interessada de verdade em música, eles estão interessados em um papel de parede sonoro – algo bom pra ter por perto desde que não interrompa seu ambiente ou desafie suas expectativas. Estou interessado em encontrar uma maneira de quebrar a noção pré-concebida, desenvolvida pela mídia e por muitos músicos que é impossível que a música improvisada encontre um lugar real na sociedade contemporânea. A questão é encontrar fãs de música. Esse é o público que vai aos meus shows na América do Norte e na Europa, pessoas entre 20 e 40 anos que ouvem todo tipo de música: jazz, rock, reggae, funk, hip hop, música erudita, etc. e são essas pessoas que os músicos de improvisação precisam encontrar e tocar para, não para o fã elitista de jazz que já tem uma definição de como a arte pode ou não ser.

Pois é, depois de uma resposta dessas, realmente é necessário dizer mais alguma coisa? Bom, quando eu fiz esta entrevista, nem havia sequer um pequeno grupo de pessoas tentando criar um digamos, cenário musical ou comunidade para esse tal de free jazz, improvisação livre ou até música experimental em certo sentido.
Algumas coisas até que de certo modo progrediram, mas outras que são essenciais, ainda continuam na era da pedra lascada, e põe lascada nisso, visse? Em plena segunda década do século XXI me deparo com discussões inúteis sobre arte e música, que não chegam a lugar nenhum, a não ser no centro do ventre de quem promove este tipo de debate.
Se eu preciso elaborar uma teoria toda complexa para explicar a minha música, algo deu errado. Na verdade o processo é muito simples: Ela agrada ou não, soa bem aos ouvidos ou não e ainda tem que contar com o gosto pessoal. Tem certos tipos de música que realmente não me acrescentam nada, mas isso é estritamente pessoal. Já vi alguns elaborarem um complexo discurso para justificar o tal do "funk carioca".
Uma coisa enfadonha é uma pessoa da classe média ou alta tentar explicar a cultura popular ou do povão. Aí eu realmente preciso ir para o intervalo comercial, mudar de canal ou melhor, desligar, dar um shutdown.
Ah, o Sashimi... o tal do peixe crú, tem gente que fica com vontade de vomitar só de falar e no meu caso, acho um trilhão de vezes o gosto do salmão crú mais saboroso do que cozido, grelhado, frito ou assado. Minha descendência japonesa? Sinceramente, não influi, pois gosto de uma boa feijoada até um tanto mais do que o sashimi.
Mas enfim, cada vez mais as coisas  ficam ainda mais complicadas, mesmo com o paralelo de pessoas que dizem gostar de um monte de coisas, mas nada em específico (mais uma vez parafraseando o Assis, autor da frase e hoje em dia reside no Japão).
E uma coisa que para mim é constrangedora e enfadonha, ouvir alguém tentando justificar seu gosto com alguma teoria, tentando requintar algo tão simples. Ora, eu gosto e pronto.
Cada vez mais, é mais difícil esta situação, tanto na música, na arte em geral, quanto na culinária (mas muitos gostam de usar o termo gastronomia, mas sinceramente, esse termo pra mim me lembra algo sobre nossas vísceras), tudo tem que ter um tratado, uma tese pra justificar, seja música de vanguarda ou um simples hamburger, que agora tem o tal do hamburger gourmet. É apenas carne moída e um pão, o resto é desnecessário, não que eu rejeite informações, mas isso não vai convencer meu paladar, tanto físico, como existencial.
Houve um rei israelita extremamente sábio que disse  o seguinte:

"E, demais disto, filho meu, atenta: não há limite para fazer livros, e o muito estudar é enfado da carne." - Eclesiastes 12:12

E no mais, eu só queria comer um hamburger (pode ser um hamburger vegetariano também) ouvindo uma música do Ramones, sem alguem tentando elaborar uma teoria qualquer...

Nenhum comentário:

 
 
Studio Ghibli Brasil